À Espera de Godot – um título que se tornou proverbial em todo o mundo. Talvez nenhuma outra peça do séc. XX tenha conhecido um alcance tão expressivo, tão global. É legítimo afirmar que, na noite em que estreou esta “tragicomédia em dois atos”, Samuel Beckett alterou por completo não apenas a literatura dramática, mas a própria condição teatral. Numa estrada, junto a uma árvore, duas criaturas sem eira nem beira, saídas de um vaudeville ou do cinema mudo, entretêm-se com jogos e picardias, rindo e chorando, discutindo tudo: um par de botas, os Evangelhos, o suicídio… Aguardam por alguém que não chega, que nunca chega: Godot, personagem-mistério que Beckett sempre se recusou a identificar com Deus, porque, mais do que aquilo que esperamos, lhe interessava realçar o que acontece enquanto esperamos. Para dirigir esta peça onde “nada acontece, duas vezes”, o Teatro Nacional São João convidou o encenador romeno-húngaro Gábor Tompa, nome cimeiro da cena internacional e presidente da União dos Teatros da Europa. Depois de um conjunto de apresentações no São João e de digressões nacionais e internacionais, Didi e Gogo regressam e recomeçam, como que suspensos da circularidade de uma linha de saxofone que pontua o espetáculo. “Talvez devêssemos recomeçar tudo”, pondera Didi. “Pode-se começar de onde se quiser”, afirma Gogo.